Júpiter e Semele
Cadmo teve do seu casamento com Harmonia um filho, Polidoro, e quatro filhas, Autonoe, Ino, Semele e Agave. Semele foi amada de Júpiter e tornou-se mãe de Baco; mas a nova paixão do senhor dos deuses não podia ficar por muito tempo oculta a Juno, que resolveu vingar-se antes do nascimento da criança trazida por Semele no seio. "A implacável deusa, resolvida a perder a rival, revestiu-se do aspecto de Beroé, a velha nutriz de Semele, e indo visitar a jovem, fez habilmente com que a conversação recaísse sobre Júpiter. Prouvera ao céu, disse à filha de Cadmo que seja o próprio Júpiter quem te ama! Mas eu temo por ti: quantas moças não foram iludidas por simples mortais que se diziam um deus qualquer! Se aquele de quem me falas for verdadeiramente Júpiter, ele saberá dar-te provas certas, vindo visitar-te com a majestade que o acompanha, quando se aproxima de Juno."
Enganada por tão artificiosas palavras, a filha de Cadmo pediu a Júpiter que lhe concedesse uma graça, sem especificar qual, e o pai dos deuses e dos homens jurou pelo Estige que a concederia. Descontente e inquieto com o que ela lhe pedira, mas não podendo retirar um juramento pelo Estige, reuniu os trovões e os raios e foi visitar Semele. Mas a habitação de um mortal não poderia resistir àquilo, e mal o deus se aproximou do palácio de Semele o incêndio se generalizou. A filha de Cadmo ficou reduzida às cinzas, e Júpiter mal teve tempo para retirar-lhe do seio o menino que ela ia dar à luz e encerrá-lo na sua coxa, onde ficou até o dia designado para o nascimento. (Ovídio)
Esse menino foi Dionisos, chamado pelos latinos Baco, ou Líber, que assim nasceu duas vezes e foi educado pelas ninfas de Nisa.
A coxa de Júpiter
O poeta Nonnos assim narra o nascimento de Baco, ao sair da coxa de Júpiter: "Entretanto, ao vê-lo sair de Semele já queimada, Júpiter acolheu Baco semiformado, fruto de tal nascimento pelo raio, encerrou-o na coxa, e aguardou o curso da lua que traria a maturidade. Dali a pouco a rotundidade amoleceu sob as dores do parto, e o menino, que passara do regaço feminino ao regaço masculino, nasceu sem deixar uma mãe, pois a mão do filho de Saturno, presidindo pessoalmente ao parto, destruiu os obstáculos e soltou os fios que cosiam a coxa geradora. Mal se livrou do divino parto, as Horas, que lhe haviam estipulado o tempo, coroaram Baco de grinaldas de hera como presságio do futuro. Cingiram-lhe a cabeça carregada de flores e ornada dos chifres de touro (alusão à Baco-Hébon). Depois, tirando-o da colina da Dracônia que o vira nascer, Mercúrio, filho de Maia, voou, segurando-o, e foi o primeiro em chamá-lo de Dionisos, como lembrança de sua origem paterna. Com efeito, na língua de Siracusa, Nisos quer dizer coxo, e Júpiter caminhava coxeando quando trazia na coxa o peso de seu filho. Chamaram-no igualmente Erafriotes, deus cosido, por ter estado cosido na coxa do próprio pai. (Nonnos).
A Lenda heróica de Baco
A conquista da Índia
A lenda histórica de Baco parece ser apenas a história da plantação da vinha, e a narração dos efeitos produzidos pela embriaguez, desde que o vinho se tornou conhecido. O temor desses terríveis efeitos explica naturalmente a oposição que se lhe depara por toda parte, quando ensina aos homens o uso do vinho por ele personificado. O culto de Baco apresenta grandes relações com o de Cíbele, e o caráter ruidoso das suas orgias relembra a algazarra que se fazia em homenagem à deusa. Mas a história da conquista da Índia dá às tradições em torno de Baco um caráter especialíssimo. Segundo vários mitologos, as narrações que a isso se prendem só se teriam popularizado após a conquista de Alexandre. Creuzer considera, pelo contrário, essa história bastante antiga.
Nessa expedição memorável, as ninfas, os rios e Sileno, sempre montado no seu burro, formavam o cortejo particular do deus, mas o cortejo era engrossado por numeroso bando de pãs, de faunos, de sátiros, de curetes e de seres estranhos, dos quais nos dá Nonnos uma nomenclatura pormenorizada no seu poema das Dionisíacas.
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