A palavra incubus vem do latim e significa “aquele que está acima”. A palavra succubus também é latina e significa “aquele que está embaixo”. Os incubi eram considerados demônios que infestavam as mulheres, enquanto que os succubi corrompiam os homens. Vale notar a intervenção patriarcal em tais significados.
A crença na possibilidade da relação sexual entre um ser espiritual e um homem ou mulher mortais é muito antiga e conhecida no mundo todo.
O Incubus é uma figura demoníaca intimamente associada ao vampirismo. É conhecida pelo hábito de invadir o quarto de uma mulher à noite, deitar-se sobre ela para que seu peso fique bem evidente sobre seu peito e então força-a a fazer sexo. O Succubus, a sua contraparte feminina, ataca os homens da mesma maneira. A experiência do ataque do incubus/succubus varia de extremo prazer ao absoluto terror. É, como já assinalou o psicoterapeuta Ernest Jones, o mesmo espectro de experiências descritas na moderna literatura entre o sonho erótico e o pesadelo. O incubus/succubus se parece com um vampiro na medida em que ataca as pessoas durante a noite enquanto dormem. Freqüentemente ataca uma pessoa noite após noite, como o vampiro dos ciganos, deixando suas vítimas exaustas. Entretanto é diferente do vampiro na medida em que não sugava sangue nem roubava a energia da vida.
Na mitologia grega, tais amores estranhos geralmente eram chamados de semideuses. Com a chegada do Cristianismo, porém, o assunto acabou ganhando um aspecto muito mais sombrio, especialmente pelo fato de a Igreja Católica dar tanta ênfase ao pecado cometido pelos mortais e às suas punições. O incubus e o succubus eram ambos considerados demônios, então.
Parece ter se originado da antiga prática de incubação, onde uma pessoa ia ao templo de uma divindade e lá repousava. No decurso da noite a pessoa teria um contato com a divindade, muitas vezes esse contato envolvia relações sexuais, ou na forma de sonho ou com um dos representantes da divindade, bem humano. Isso estava na raiz de diversas práticas religiosas, incluindo a prostituição nos templos. A religião de incubação mais bem sucedida estava ligada a Esculápio, um deus da cura que se especializara, entre outras coisas, em curar a esterilidade. O cristianismo, que equiparou as divindades pagãs aos seres demoníacos, encarava essa prática de relações com uma divindade como forma de atividade demoníaca.
Através dos séculos, duas principais correntes de opinião sobre as origens dos incubi e dos succubi competiam uma com a outra. Alguns a viam como sonhos, invenções de uma vida fantasiosa da pessoa que experimentava tais visitações. Outros argumentavam a favor da existência objetiva dos espíritos malignos; eram instrumentos do demônio. No século XV os líderes religiosos, especialmente os que estavam ligados à Inquisição preferiam essa última explicação, ligando a atividade demoníaca dos incubi e succubi à bruxaria. O grande instrumento dos caçadores de bruxas, Malleus Maleficarum, “O Martelo das Bruxas”, supunha que todas as bruxas se submetiam voluntariamente aos incubi.
Muitos sacerdotes discutiam sobre a natureza dos incubi e dos succubi e do pecado envolvido em um possível acasalamento com eles. Muitos afirmavam que o demônio (muitas vezes chamado de assexuado) ora se transformava em um, ora em outro, para assolar tanto homens quanto mulheres.
De fato, o argumento utilizado por sacerdotes cristãos era o de que o demônio era muito perspicaz e depravado sexualmente, e que desta forma poderia receber o sêmen de um homem (agindo como um succubus) e, na mesma noite, transmití-lo a uma mulher (agindo como incubus).
No entanto, outros sacerdotes diziam que era impossível a geração de frutos a partir dessas uniões, e declaravam que seu único propósito era o de fazer homens e mulheres desfrutarem do sexo, para sua condenação.
A existência objetiva do incubus/succubus foi sustentada por Tomás de Aquino no século XIII. Argumentava que crianças poderiam mesmo ser concebidas pelas relações entre uma mulher e um incubus. Acreditava que um espírito maligno poderia mudar de forma e aparecer como um succubus para um homem ou um incubus para uma mulher. Alguns pensadores argumentavam que o succubus coletava sêmen e, depois, na forma de um incubus, depositava-o numa mulher. As freiras parecem ter sido um alvo especial dos incubi pois os espíritos malignos pareciam ter prazer em atormentar aqueles que haviam escolhido uma vida santa. A idéia da existência objetiva dos incubi e succubi permaneceu até o século XVII quando uma tendência para a compreensão mais subjetiva se tornou perceptível.
Jones, um psicólogo freudiano, juntou o sucubus/inccubus e o vampiro como expressões de sentimentos sexuais reprimidos. O vampiro era visto como o mais intenso dos dois. Em virtude das semelhanças entre vampiros e os incubi/succubi, muitas das formas deste último aparecem freqüentemente nas listas de vampiros diferentes pelo mundo afora, como follets (francês), duendes (espanhol), alpes (alemão), e folletti (italiano). Intimamente ligado ao incubus estava o mare (teutônico antigo), mara (escandinavo) ou mora (eslavo), o espírito maligno de um pesadelo.
Jan L. Perkowsi assinalou que as histórias do vampiro eslavo também incluíam elementos do que parecia ser o mora. Ele os considerou no cômputo de vampiros que tinham experimentado uma contaminação demoníaca. Distinguiu cuidadosamente o vampiro (um cadáver reavivado) e o mora (um espírito de forma esférica) e criticou vampirologistas como Montague Summers, Dudley Wright e Gabriel Ronay por confundir as duas coisas. Também criticou Jones pelo mesmo motivo. Conquanto conhecesse que o vampiro e o mora compartilhavam o mesmo tipo de vítima (alguém dormindo), o fenômeno do vampiro precisava ser diferenciado na medida em que estava centrado em um cadáver enquanto o fenômeno mora não tinha essa referência e estava centrado inteiramente na vítima que havia sobrevivido a um ataque de espíritos malignos.
Havia também a teoria de que o demônio poderia sim, gerar filhos, e a própria história do “anticristo” é a de que ele teria sido gerado por um demõnio com uma bruxa. O filme ‘O Bebê de Rosemary’ é um bom exemplo contemporâneo desta afirmação.
A ideia da amante do demônio chamou a atenção de muitos escritores, um dos quais, Joris-Karl Huysmans, tratou-o com um discernimento mais amplo do que a maioria, em sua brilhante a assustadora visão, ‘La-Bas’. Huysmans começou nesse livro a dar uma figura do satanismo praticado na cidade de Paris de seus dias, na década de 1890. A maior parte do que ele escreve é baseada em fatos.
Seu herói é seduzido e acaba tendo um caso amoroso com uma jovem mulher casada, que é uma satanista secreta. Ela se vangloria, diante dele, de um estranho poder que ela possui. Se existe um homem que ela deseja, tudo o que ela tem que fazer é pensar nele fixamente antes de dormir, para conseguir desfrutar da relação sexual com ele em seus sonhos.
Segunda ela, esse poder foi-lhe dado pelo Mestre Satanista, um padre destituído. Mais tarde, ela leva seu amante a uma Missa Negra realizada pelo ex-padre mas, enojado, ele se prepara da má influência dela.
O que é interessante neste relato de copulação com os incubi é que ele ecoa uma outra explicação muito mais antiga, e parece ser improvável que Huysmans soubesse dos fatos, já que ela vem da Inglaterra.
Na antiga peça de Thomas Middleton, The Witch, da qual Skakespeare cita a canção “Black Spirits”, usada em ‘Macbeth’, uma das bruxas é forçada a dizer:
Que homem jovem podemos desejar nos dar prazer,
Mas de quem desfrutamos em um incubus?
A maior parte da doutrina das bruxas de Middleton foi tirada do livro ‘Discoverie Of Witchcraft’, de Reginald Scot, no qual ele descreve os efeitos dos ungüentos das bruxas: “Dessa forma em uma noite de luar elas parecem ser levadas pelos ares, em festa, cantos, danças, beijos, carícias e outros atos de relação sexual, com jovens que elas tanto desejam e amam”.
Não há menção do ungüento das bruxas no ‘La-Bas’, mas a possibilidade dessas experiências por meio da pura auto-sugestão não parece de forma alguma difícil demais de ser feita. Algumas bruxas americanas fazem uso de um ungüento chamado toloachi e dizem que as mulheres que o usam “não têm necessidade de homens”. Sua composição é secreta e aparentemente alucinógena, mas um ingrediente principal é a Datura Tatula, uma planta parente do estramônio.
Esse específico tipo de alucinógeno, ou experiência em sonho, parece ser a verdadeira base de todas as histórias sobre os incubi e os succubi, sem precisar de nenhum recurso de diabos ou demônios.
O tema da relação sexual com o demônio, ou com uma amante do demônio, geralmente acontece nas confissões extorquidas das bruxas e lidas durante seus julgamentos em tempos antigos. É claro que muitas das “confissões” eram forçadas, e em muitos casos as pessoas eram torturadas para confessar aquilo que seus acusadores exigiam.
Em muitos dos antigos relatos de relações sexuais entre os incubi e os succubi e os seres humanos, a ênfase é colocada no intenso prazer advindo desss abraços. Depois de 1470, porém, os relatos compilados por caçadores de bruxas começaram a mudar sua atitude e história horríveis e nojentas passaram a ser contadas, sobre como a relação com o demônio era repulsiva e agonizante.
Assim, exigia-se que as bruxas acusadas sob tortura concordassem em afirmar que todos os aspectos sexuais eram repulsivos, fazendo com que as imaginações causadas pelas idéias de um sexo afrodisíaco não pudessem jamais acontecer.
Os autores do ‘Malleus Malleficarum’ estavam interessados nos detalhes de tais relações sexuais, é claro. Esse livro foi publicado pela primeira vez em 1486 e durante muitos anos foi o manual oficial da perseguição das bruxas. Seus autores sacerdotais nos dão uma descrição menos desagradável de tais copulações, o que mostra a possível natureza auto-sugestiva de tais relatos.
Eles dizem que em todos os casos dos quais eles tiveram conhecimento, o demõnio sempre apareceu de forma visível a uma bruxa. “Mas com relação a qualquer espectador, as próprias bruxas sempre foram vistas deitadas de costas nos campos ou nas florestas, nuas até o umbigo, e parece estar claro a partir da disposição do tronco e dos demais membros que fazem parte do ato venéreo e do orgasmo, assim como também da agitação de suas pernas e das coxas, que, embora totalmente invisível aos espectadores, elas estavam copulando com os demônios incubi, apesar de que, às vezes, isso fosse raro, mas no final do ato um vapor muito escuro, com a altura aproximada de um homem, aparecia suspenso no ar levantando-se do corpo da bruxa”.
Considerando-se a atmosfera da Idade Média, quando o prazer sexual era equacionado com o pecado e a ignorância, a superstição e a regressão, controlando as mentes das pessoas, cenas como essas eram totalmente compreensíveis sem a intervenção de quaisquer “demônios”, exceto aqueles que existiam nas mentes dos participantes, tanto das mulheres como dos “espectadores” escondidos.
Relatos das relações de homens com os succubi são menos freqüentes e, quando aconteciam, muitas vezes seguiam padrões das histórias dos incubi. O succubus toma a forma de uma linda mulher, mas sua vagina é fria como gelo e, às vezes, seu amante vê suas pernas terminando em uma forma de patas partidas.
Mais uma vez, os relatos mais antigos dos succubi os apresentam como demônias bonitas e apaixonadamente atraentes, que apareciam para sacerdotes ou eremitas sagrados com o objetivo de tentá-los – uma aventura que na maioria das vezes era bem-sucedida.
Os relatos do corpo frio como o gelo do succubus parecem ser meramente imitados daqueles contos semelhantes dos incubi, pois a maioria das histórias dos succubi representa-os como sendo diabolicamente sedutores e atraentes, tomando a forma de cortesãs de prostitutas para tentarem os homens. Os relatos nunca falavam do momento da chegada desses demônios porque as pessoas só se davam conta de sua presença quando o ato sexual já estava em andamento.
O Lamiae e o Empusae da lenda pagã eram seres parecidos, e a origem da maioria dessas histórias parece estar presente nos sonhos eróticos que vêm para os homens à noite sem vontade consciente. Em sua maior parte, esses sonhos são prazerosos, mas se sentimentos de culpa e o terror do pecado faziam-se presentes, os fantasmas assumiam uma forma mais sombria, e o sonhador entrava nos reinos dos pesadelos.
Ao analisarmos todos esses fatos, o que podemos dizer é que aquela era uma época autoritária, de poderio máximo da Igreja, onde pecadores eram severamente punidos e humilhados. Assim, sentir desejo sexual ou mesmo ter orgasmos espontâneos durante os sonhos era considerado repulsivo na época. Desta forma, alegar que um ser do demônio tenha lhe visitado à noite era muito mais digno de compaixão que de condenação.
Da mesma forma, relatos de sacerdotes cristãos que se diziam tentados por belas mulheres, chamadas de demônios, ao nosso ver nada mais eram do que uma maneira de tentar safar-se da situação. Era muita mais fácil dizer que o demônio tinha atacado à noite do que dizer “uma mulher entrou aqui, fez sexo comigo e eu gostei”. Eles não podiam dizer isso e acabou tornando-se um pacto silencioso a crença em tais seres diabólicos.
Torna-se clara tal afirmação ao analisarmos alguns relatos da época, especialmente marcados pelo teor de uma sociedade patriarcal. O incubus, demônio masculino, tomava as mulheres porque elas eram bruxas, porque elas iam às florestas… Os succubi, por sua vez, pegavam o homem desprevinido, puro e inocente, e lhe tentavam. Naquela época, uma visão como essa tinha muito crédito, mas hoje em dia é engraçado e até absurdo ainda encontrarmos pessoas que defendam tais teses.
Incubi e succubi tornam-se, então, meras desculpas para justificar o comportamento humano natural de sentir prazer durante o ato sexual e de desejar outras pessoas, mesmo enquanto estamos dormindo, em sonhos. Tornam-se um bode expiatório da Igreja para condenar todos aqueles que possuem tais sentimentos, condenando-os como pecadores e acusando-os de manter relações com o próprio demônio.
Tornam-se uma desculpa de sacerdotes cristãos que desejavam outras mulheres mas não podiam, devido ao celibato. Tornam-se uma desculpa para justificar uma mulher grávida sem ao menos ser casada, especialmente se esta mulher fosse filha de alguém importante na época e que temia perder seu status social. Tornam-se desculpas para justificar um filho que não fosse parecido com o marido da mulher (transferência de sêmen através de tais seres?).
Enfim, as utilidades dos incubi e succubi eram diversas na época e até hoje tais crenças ficam incorporadas às mentes de algumas pessoas, relacionando sonhos sexuais a presença de espíritos ou mesmo em filmes aparentemente inconscientes como ‘O Bebê de Rosemary’.
Quando pensamos em crenças medievais, pensamos que se tratam de algo muito antigo e ultrapassado. Mero engano. Tais crenças ainda estão presentes em nossa sociedade, devido ao preconceito e à velha história de que “as pessoas não gostam de ler”. Apenas estudando, conhecendo e vivendo, aprenderemos.
Fontes:
http://bruxaria.net/2008/04/04/incubus-e-sucubus/
http://mortesubita.org/demonologia/estudos/estudos-demonologia/incubus-e-succubus/
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